quinta-feira, 21 de janeiro de 2010
Operário em (des)construção
“Era ele que erguia casas/Onde antes só havia chão/Como um pássaro sem asas/Ele subia com as asas/que lhe brotavam da mão/mas tudo desconhecia/de sua grande missão.../ Como tampouco sabia/Que a casa que ele fazia/ sendo a sua liberdade/ era a sua escravidão”.
Trecho de “Operário em Construção´ de Vinicius de Moraes.
O pedreiro Gilcimar Pereira Santos, de 23 anos, provavelmente não conhecia o poema-canção de Vinicius de Morais, que fala dos milhares de trabalhadores anônimos que ganham o pão com o suor de seu rosto, numa profissão estafante e exposta a riscos de acidentes. Gente que ajuda a construir um país, ergue mansões e muitas vezes mora em casas que, que de tão precárias, só com muito boa vontade podem receber o nome de moradias.
É o caso de Gilcimar, morador do bairro São Pedro, na periferia de Itabuna, em que às casas simples, construídas à custa de muito sacrifício, somam-se a escassez de serviços públicos e uma violência desenfreada.
Gilcimar, entre o caminho aparentemente fácil da criminalidade e a vida difícil, mas decente, de trabalhador, optou pela profissão de pedreiro, que lhe garantia uma existência modesta, mas digna.
Atuava como pedreiro, sem carteira assinada e sem poder se dar ao luxo de escolher trabalho.
E na impossibilidade de poder escolher ou dispensar trabalho, Gilcimar trombou com a irresponsabilidade, um item não necessariamente raro no setor de construção civil, notadamente em obras menores, em que a inexistência de equipamentos de segurança ou de respeito às normas básicas do setor expõem os operários a risco de vida.
No caso de Gilcimar, essa combinação foi fatal.
Numa manhã de calor sufocante, ele trabalhava numa construção na área central de Itabuna, quando a barra de ferro que levava nas mãos tocou no fio de alta tensão da rede elétrica.
A violência de descarga foi tão violenta, que o pedreiro morreu na hora, eletrocutado.
Poderia se afirmar que a morte de Gilcimar Pereira dos Santos foi um acidente, uma fatalidade, dessas que podem acontecer com qualquer um.
Não foi.
Além de o operário trabalhar sem equipamentos de segurança, a obra estava embargada pela Prefeitura de Itabuna. O embargo não ocorreu apenas uma, mas duas vezes.
Ainda assim a obra continuou, no lamentável senso comum de que lei existe mesmo é para ser ignorada.
Ou seja: o pedreiro Gilcimar não poderia não deveria estar ali.
Mas estava e do rapaz trabalhador e brincalhão (os amigos afirmam que ele estava sempre sorrindo, encarando a vida com otimismo e bom humor) restou apenas um corpo carbonizado estendido no chão.
Um operário em (des)construção.
Mais uma vítima da irresponsabilidade casada com a impunidade.
Que é rima, mas nunca é solução.
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