quarta-feira, 10 de junho de 2009

DESCAMINHOS DOS ÍNDIOS

No início da década de 90 do século passado, a destruição avassaladora provocada pela vassoura-de-bruxa nas lavouras de cacau do Sul da Bahia, coincidiu com a expansão dos movimentos dos trabalhadores sem terra.

Propriedades rurais abandonadas por produtores descapitalizados e/ou desesperançados, que surgiam às dezenas diante da rapidez com que a ´vassoura´ jogou a colheita a níveis abissais, eram o alvo fácil para invasões/ocupações (neste caso, mera questão de semântica) que não raro resultavam em desapropriações e implantação de assentamentos.

Alguns produtores viam até com bons olhos a desapropriação de suas terras, extremamente desvalorizadas e sem compradores à vista. Daí que, ao contrário do que ocorre em vários pontos do Brasil, salvo um ou outro entrevero, a expansão dos assentamentos no Sul da Bahia se deu sem explosões de violência. Hoje eles somam quase 200 propriedades, numa convivência sem sobressaltos com os agricultores que permaneceram em suas terras.

Algumas cidades, como Arataca, só não sumiram do mapa por conta da presença dos sem-terra, que com a produção de cacau e outras culturas e os recursos recebidos do Governo Federal, movimentavam uma economia em frangalhos.

Naquela época, a fartura de terras a serem ocupadas era tanta que, embora ninguém admita abertamente, pessoas eram recrutadas nas periferias de Itabuna, Ilhéus e até das médias e pequenas cidades sulbaianas para engrossar os acampamentos à beira das rodovias, primeiro passo para a ocupação e posterior posse das fazendas.

Muitos, embora tecnicamente sem terra (na verdade, sem tudo, visto que viviam na mais absoluta exclusão social) não tinham qualquer experiência na vida rural. Recebiam seus terrenos e logo depois os passavam adiante, para retornarem à vida miserável de sempre.

O fato é que o movimento teve mais acertos do que equívocos, floresceu e hoje não há como negar sua importância sócio-econômica na região.

Ao recordar o caso dos sem terra, não há como deixar de fazer uma analogia com o que está por ocorrer nessa disputa por 47 mil hectares que compreendem pedaços significativos de Ilhéus, Una e Buerarema.

De comum, a luta de povos excluídos por uma vida mais digna. Por que, nisso não se pode negar o os direitos dos indígenas, sejam eles tupinambás ou tupiniquins. E a ainda discreta abordagem de alguns moradores de áreas rurais para que reivindiquem a condição de índios, para se beneficiar de uma eventual demarcação.

As semelhanças, entretanto, terminam aí. A área apontada pela FUNAI como propriedade dos tupinambás é composta por micro e pequenas propriedades, ocupadas há pelo menos um século por famílias que praticam a cultura de subsistência e do comércio da produção excedente, localizadas nas zonas rurais dos três municípios involuntariamente envolvidos no imbróglio.

Há ainda a questão de Olivença, um pólo turístico onde imperam pequenos e médios empreendimentos, que igualmente passariam a integrar a reserva indígena.

Trata-se, portanto, de uma questão complexa, que terá um longo debate pela frente, agravada pelo clima de tensão, já que alguns supostos indígenas entenderam o que é uma simples proposta da Funai como uma espécie de salvo-conduto para invadir fazendas e aterrorizar pequenos produtores.

Não é esse o caminho. Há que se respeitar, é sempre bom repetir, os direitos nas nações indígenas, espoliadas ao longo de séculos. Mas há que se respeitar também as famílias que tem o direito legítimo sobre as terras em que moram e produzem seu ganha pão.

Do jeito que as coisas caminham, vem aí um confronto de conseqüências previsíveis.

E isso não é bom para ninguém.

Um comentário:

Gugu Hoisel disse...

Essa é uma verdade imensa, e me faço uma simples pergunta como agora depois de décadas o governo vai negar a legitimidade dos títulos de terra legitimados pelo próprio estado?