sexta-feira, 22 de maio de 2009

A MULHER DA CAIXA DE CHICLETES


Vez por outra somos surpreendidos por notícias dando conta de que pessoas que cometeram pequenos delitos, cuja punição poderia ser transformada em prestação de serviços comunitários, permanecem encarceradas, como se fossem marginais de altíssima periculosidade.

A mais recente, e não necessariamente a última, demonstração de que a justiça nem sempre é justa envolve uma mulher de Sete Lagoas (Minas Gerais) que está presa desde 2007 por ter furtado caixas de chicletes de um supermercado. As caixas somavam juntas o “estratosférico” valor de R$ 98,80.

A mulher vai completar três anos na cadeia e um pedido de habeas corpus acaba de ser negado por Marco Aurélio Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) .

O fato de que a mais alta corte da justiça brasileira tenha que julgar um delito menor já é por si só um absurdo.

Absurdo maior é o ministro negar a soltura de uma pessoa presa por ter roubado caixas de chicletes, ainda que o magistrado tenha agido estritamente dentro da lei.

A lei, ora a lei!

Ela, que deveria ser igual para todos, é extremamente rigorosa com os ladrões de galinha (e de chicletes) e inacreditavelmente flexível com os que cometem grandes golpes, sejam eles mega-empresários, banqueiros ou políticos.

Casos dessa flexibilidade existem aos montes. Os chamados “tubarões” quando são presos, passam pouco tempo na cadeia, porque sempre aparece um proverbial habeas corpus que garante a liberdade e a impunidade.

Tudo dentro da lei, porque sempre existe uma filigrana, uma brechinha que permite aos grandes ladrões (porque na prática eles são isso mesmo, ladrões) evitarem o dissabor de uma temporada atrás das grades.

A lei, ora a lei!

Ágil para quem dispõe de bons advogados e de prestígio (ou das duas coisas juntas) ela é lenta para os pobres coitados que dependem da assistência judiciária gratuita e tem seus processos caminhando, quando caminham, a passos de tartaruga em meio à burocracia da justiça.

O que para os afortunados leva dias, ou às vezes poucas horas, para os desvalidos pode demorar anos.

No caso da mulher da caixa de chicletes, Marco Aurélio Melo baseou sua decisão de negar o pedido de hábeas corpus baseado no entendimento de que não se tratou de um furto famélico, ou seja, ela não roubou para saciar a fome.

Deveria valer também para aqueles que, ao saquear cofres públicos e aplicar grandes golpes no sistema financeiro (sempre absorvidos pelo governo), saciam a própria gula e condenam à fome milhares, milhões de pessoas que poderiam ser beneficiadas com os recursos desviados.

Mas, ai já entramos no campo da subjetividade.

Na frieza da lei, a mulher da caixa de chicletes e outros tantos ladrões de galinha vão continuar mofando atrás das grades, pelo fato de terem sido presos em flagrante delito.

Como é difícil pegar um larápio VIP com a mão na grana e a boca no cofre, eles continuarão respondendo os processos em liberdade, de recurso em recurso, até o julgamento final, que pode acontecer no Dia de São Nunca.

Nossa Justiça não é apenas cega, como também pode ser surda e muda.

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