sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Suprema Impunidade

Em dois dias seguidos, o Supremo Tribunal Federal, a principal instituição do judiciário brasileiro, tomou decisões que, mesmo sob o pretexto de garantir o direito de defesa e evitar constrangimentos, deixam no ar a velha e conhecida sensação de impunidade.
Primeiro, decidiu que políticos que respondem a processos, incluindo-se aí a improbidade administrativa, popularmente conhecida como “meter a mão no dinheiro público”, poderão ser candidatos nas eleições deste ano. A exceção fica por conta dos julgamentos em que não cabe recurso.
Como sempre há uma brecha jurídica e os processos se arrastam por décadas, na prática isso significa que sujeito pode se candidatar indefinidamente e, se essa for a sua vocação, roubar indefinidamente, porque a lei, mesmo de forma enviesada estará ao seu lado.
Políticos envolvidos em roubalheiras, algumas delas fartamente documentadas, estão aí de novo na disputa eleitoral, boa parte deles com chances concretas de vitória.
A decisão do STF vai de encontro aos anseios da sociedade, farta de tantos escândalos, de tanta rapinagem. O impedimento para que esses maus políticos (para usar uma expressão leve) se candidatassem, poderia servir como uma espécie de freio.
Ocorreu justamente o contrário. A sinalização é de estímulo à corrupção, mesmo que evidentemente não tenha sido essa a intenção do Supremo.
Enquanto isso, o cidadão comum que é aprovado num concurso público e que por uma circunstância qualquer foi parar no Serviço de Proteção ao Crédito, como não pagar uma prestação de loja ou a conta de telefone, fica impedido de assumir o cargo até quitar o débito.
Ninguém está aqui incentivando o calote, mas não deixa de ser uma ironia que a lei seja uma para o sujeito que deixou de pagar 80 reais de prestação e vai parar no SPC e outra para o político que rouba milhões de reais e pode se candidatar, sob as bênçãos dos STF.
Em outra decisão igualmente polêmica, Supremo Tribunal Federal decidiu que algemas só podem ser usadas em casos excepcionais ou de evidente perigo de fuga. Na verdade, o STF estava julgando um caso isolado, de um condenado que apelou da sentença por se sentir constrangido a usar algemas diante dos jurados.
O Supremo não só anulou o tal julgamento como, aproveitando a deixa, estendeu o benefício para todo mundo.
Todo mundo?
Um Daniel Dantas, um Paulo Maluf, um Zuleido Veras, um empresário ou político de peso sempre terão um advogado ou assessor para lembrar à polícia que eles não podem ser constrangidos com o uso das algemas. Mais um pouco e os policiais terão que usar a polidez, tipo: “por favor, se não for incômodo, queira fazer a gentileza de nos acompanhar”.
Camburão, nem pensar, que isso também constrange. Que tal dispor de uma frota de limusines?
Será que o pobre coitado que roubou um quilo de feijão no supermercado ou mesmo o bandido que surrupiou um aparelho de DVD, terão tratamento idêntico?
Ou continuarão sendo algemados e caindo na porrada, como acontece nas melhorias famílias, perdão, nas melhores delegacias?
Num país em que perante a lei todos são iguais, mas que na prática uns são mais iguais que os outros, a impunidade pode até ser suprema.
Mas é para poucos.

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