Gerinaldo Souza Santos tem 60 anos e aparenta mais. Trabalhador rural, expulso das roças de cacau pela crise que há duas décadas se abateu sobre uma região aferrada à monocultura, sobrevive de pequenos bicos e mora num bairro na periferia de Ilhéus.
Na verdade Gerinaldo mora nas bordas de um bairro, uma fresta de terreno à beira de um córrego por onde escoam dejetos e lixo.
Na rua de Gerinaldo saneamento básico é uma abstração. Água tratada também. Pavimentação, quase um delírio. O mato e os buracos dificultam a passagem das pessoas, gente humilde e sofrida como Gerinaldo. Sub-empregados, desempregados e muitas, muitas crianças
Para não dizer que não existe nenhuma intervenção urbana no local, há uma ponte de concreto, obra de uma inutilidade gritante diante da carência por serviços essenciais. Uma ponte que só não liga o nada a lugar nenhum porque a rua em que Gerinaldo e seus vizinhos moram está ali, abrigando barracos de madeira paupérrimos.
A ponte, que não deve ter custado barato, é um monumento ao desperdício, uma ode à inversão de prioridades na gestão de recursos públicos.
O mais incrível é que, a despeito de tantas dificuldades, Gerinaldo e seus vizinhos não perdem a capacidade de sorrir. Nem perdem a esperança.
Pedem melhorias a quem aparece por lá, mas não reclamam, não protestam, não demonstram qualquer tipo de revolta.
Acreditam, sempre, que a vida pode melhorar.
Mesmo que uma ponte simbólica, de uma dimensão imensurável, os separe daquilo que é um direito deles: o acesso aos serviços básicos.
Gente como Gerinaldo Souza, integrante de uma imensa legião de excluídos, tem sido presença recorrente neste espaço. Evitando-se cair na vala comum -e inútil- da pieguice, é impossível para qualquer pessoa que tenha o mínimo de sensibilidade e noção do que é solidariedade, não se comover (e se indignar) com essa situação.
É inevitável constatar, diante de mais um escândalo como o do uso inadequado dos cartões corporativos, que a vida dura de Gerinaldo e seus vizinhos (e de milhões de Gerinaldos espalhados por esse Brasil afora) seria menos dura se tantos recursos públicos não fossem desperdiçados e desviados.
Cada centavo que é gasto em mordomias ou desviado para a corrupção faz falta na hora de se investir em saneamento básico, moradia, escolas, etc.
Quando alguém faz um saque indevido com um cartão corporativo, na prática está saqueando os gerinaldos, josés, antonios, raimundos, marias, josefas, gerinaldas, etc...
Quem sabe um dia Gerinaldo, seus vizinhos e essa brava gente brasileira, apareçam aqui como exemplo de inclusão social.
Ainda há uma ironia que, propositadamente, deixei para o final do texto: Gerinaldo mora numa rua chamada Alegria.
Rua Alegria, s/n, bairro Nossa Senhora das Vitórias, Ilhéus, Bahia, Brasil.
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